Clube do Choro por Severino Francisco

O Clube do Choro de Brasília foi tema da coluna Crônica da Cidade, de Severino Francisco, no Correio Braziliense, no dia 15 de junho. Leia abaixo a coluna na íntegra.

A DELICADEZA DO CHORO

Em meio a uma avalanche de notícias ruins, encontrei na matéria de Irlam da Rocha Lima, publicada na edição de terça-feira do Correio, uma imagem linda: a de crianças armadas de bandolins, de cavaquinhos e de pandeiros. Eram estudantes da rede pública de São Sebastião e de municípios do Entorno que visitaram a Escola de Choro Raphael Rabello para se iniciar no primeiro gênero musical brasileiro, por meio de convênio com a Secretaria de Educação do DF.
É tudo que as crianças e os adolescentes precisam neste momento: arte-educação ou educação cultural. Eles estão entregues à ignorância e à barbárie, à deriva no bombardeio de múltiplas possibilidades da era virtual. Caetano Veloso afirmou que o funk carioca e o breganejo universitário são a nova Tropicália. Com todo o respeito e, diria mais, com a quase devoção que tenho por Caetano, discordo. É verdade que o funk carioca fez experiências inventivas de fusão da batida original norte-americana com o candomblé, mas as letras são de uma indigência mental constrangedora.
Não é moralismo, assisti a um documentário em que as próprias adolescentes de 13 a 16 anos, mães precoces, estabeleciam uma relação crítica com o funk como referência de valores e de comportamento sexual. Quanto ao breganejo universitário, é uma música pobre, com letras repetitivas e sem imaginação. É o brega sem humor ou ironia. Em vez de nova tropicália, o funk carioca e o sertanejo universitário são a nova mediocrália.
Por isso, é um privilégio termos em Brasília a Escola de Choro Raphael Rabello, criada por Reco do Bandolim. Antes dela, o chorinho era considerado “música de velho”. Mas a escola provocou uma pequena revolução. Agora, a gente vê uma legião urbana de crianças e adolescentes fazendo diabruras com o cavaquinho ou o bandolim nas mãos. Com lucidez, Reco percebeu que uma cidade nova e artificial como Brasília precisa de instituições sólidas para se desenvolver no campo da cultura. Ele é uma espécie de Dom Quixote baiano, idealista, mas pragmático, capaz de mover montanhas de empecilhos com sua flama. Hamilton de Hollanda, o nosso Jimi Hendrix do bandolim, praticamente tomou chorinho na mamadeira, a partir dos 5 anos de idade. Rafael dos Anjos é diretor musical e arranjador do grupo de Arlindo Cruz. O violonista Rogério Caetano toca no grupo de Zeca Pagodinho. Todos são filhotes do Clube do Choro e da Escola de Choro Raphael Rabello.
Que sejam ampliadas as ações educativas das duas instituições, que passaram por todos os crivos de qualidade. Como bem disse o cineasta Jorge Furtado: “Sem cultura não existe país. Somos o país do Chico Buarque, do Lupicínio e do Pixinguinha. Os políticos vão todos passar, mas a cultura vai sobreviver”.

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